OAB Ceará pede saída imediata de Mauro Albuquerque da Secretaria da Administração Penitenciária

A Ordem destaca violação das prerrogativas dos advogados e lembra supostos casos de tortura nos presídios

Foto: Foto: Fabiane de Paula

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A Ordem dos Advogados do Brasil – Secção do Ceará (OAB-CE) pediu, de forma oficial, nesta terça-feira (28), a saída de Luís Mauro Albuquerque Araújo, enquanto titular da Secretaria da Administração Penitenciária e Ressocialização do Ceará. O pedido vem após uma série de embates entre a SAP e a OAB e um dia depois do governador Elmano de Freitas anunciar a substituição do gestor da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS).

O presidente da OAB Ceará, Erinaldo Dantas, encaminhou ofício ao governador requerendo a troca da titularidade da SAP, afirmando que vem sendo violada a prerrogativa dos advogados.

O Diário do Nordeste questionou o governo acerca do pedido e aguarda posicionamento oficial.

O QUE DIZ A OAB

A Ordem destaca que frequentemente requer que a SAP cesse "as ilegalidades e abusos das medidas adotadas nas unidades prisionais, todavia, na grande maioria dos casos, o objetivo só é alcançado após a intervenção do Judiciário, seja através da Corregedoria dos Presídios, seja por decisões em processos judiciais".

"Nós não vamos abrir um milímetro. Foram dezenas de representações, algumas criminais, nós vamos continuar nisso. Violar prerrogativa é violar direito estabelecido em Lei, é crime. É imperativo que medidas imediatas sejam tomadas para garantir a proteção dos direitos humanos e assegurar o respeito às prerrogativas legais da advocacia. A substituição do Secretário é necessária para restabelecer a integridade e a confiança no sistema penitenciário do Estado, então, esperamos que o governador possa dar a resposta em prol da advocacia e da sociedade cearense",
Erinaldo Dantas
Presidente da OAB-CE

VIOLAÇÕES DE PRERROGATIVAS APONTADAS PELA OAB NO OFÍCIO:

  • "Obrigatoriedade de agendamento prévio para atendimento dos presos pelos advogados, notadamente na CPPL III, o que resulta na incomunicabilidade do preso por um prazo médio de sete dias;"
  • "Constrangimento às advogadas em período menstrual (através de vistorias íntimas), body scan operados por policiais penais homens e assédios sexuais de agentes penitenciários;"
  • "Quantidade reduzida de parlatórios para atendimentos dos presos, mesmo após a colaboração da OAB Ceará, que forneceu ar-condicionados, interfones, acrílicos e cadeiras;"
  • "Implantação de câmeras em parlatórios, violando as prerrogativas dos advogados e o direito dos presos de ter contato reservado com o advogado;"
  • "Limitação de número de atendimento de presos por advogado, bem como a regulação de tempo da entrevista;"
  • "Instauração de Processos Administrativos Disciplinares em excesso e sem a participação de advogados, com aplicação de punições coletivas em desfavor dos presos;"
  • "Punições aos advogados que não comparecem aos atendimentos jurídicos previamente agendados;"
  • "Negativa de instalação de sala da OAB em unidades prisionais, a exemplo da Unidade de Segurança Máxima;"
  • "Imposição de dificuldades no cumprimento dos alvarás de soltura nos fins de semana, pontos facultativos e feriados, o que ocasiona a permanência do interno por tempo excessivo;"
  • "Graves denúncias de tortura de presos, tanto nas unidades prisionais masculinas como femininas, constatados inclusive por relatório elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça"

'PERSONA NON GRATA'

Em 2023, a Ordem declarou que Mauro Albuquerque é 'persona non grata' na advocacia. O diretor-adjunto de prerrogativas da OAB-CE, Márcio Vitor de Albuquerque, destaca ainda a dificuldade no agendamento junto à SAP.

"Deixando claro que a advocacia pode ter certeza de que já não foram poucas medidas. Nós tivemos, até no ano passado, um desagravo público em decorrência dessas atitudes que desafiam, portanto, as prerrogativas dos advogados e qualquer outra flagrante ilegalidade cometida por esta secretaria, certamente a OAB não vai ficar silente, nós vamos investir de forma imediata", conforme Márcio Vitor.

A conselheira estadual e presidente da Associação dos Advogados Criminalistas do Estado do Ceará (ACRIECE), Ana Paula Rocha lamenta "que um órgão público venha, há cinco anos, descumprindo de forma reiterada as normas, a legislação, que tem o dever de agir e não agem, que, por exemplo, o executivo, o legislativo, judiciário que acompanham de forma inerte muitas vezes o que vem acontecendo dentro do sistema prisional, que violam as prerrogativas da advocacia e, aqui não vou nem adentar os direitos humanos entre outras situações", disse.

Já a conselheira estadual e presidente da Associação de Advogados Criminalistas do Brasil no Ceará (ABRACRIM-CE), Ligia Peixe, acrescenta que "se nós conseguíssemos tirar Mauro Albuquerque da SAP, seria a maior vitória não da advocacia Criminal, mas de toda a advocacia que está sendo desrespeitada. E quando desrespeita a um, desrespeita a toda a advocacia. Esse é o meu humilde entendimento".

DENÚNCIAS DE TORTURAS

Há dois anos, o Diário do Nordeste vem noticiando supostas práticas de torturas nas unidades prisionais do Ceará. Em 2023, a diretoria da Unidade Prisional Agente Elias Alves da Silva (UP-IV), em Itaitinga, chegou a ser afastada temporariamente do presídio após graves denúncias.

A OAB também elenca a violação dos direitos aos presos como motivo para a saída do atual secretário: "o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ainda no ano de 2022, elaborou relatório de inspeções nos estabelecimentos prisionais do Estado do Ceará, onde restou constatado graves relatos de maus-tratos e tortura contra presos, aplicados sem representar resposta a um ato de indisciplina de um preso, cela ou ala do presídio".

TROCA NA SSPDS

Nessa segunda-feira (27), o governador do Ceará anunciou a troca de Samuel Elânio por Roberto Sá como secretário da SSPDS.

A coordenadora do Curso de Direito e do Núcleo de Apoio às Vítimas de Violência Urbana (NAVV), da Universidade de Fortaleza (Unifor), professora Juliana Mamede, e o sociólogo do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), da Universidade Federal do Ceará (UFC), professor Luiz Fábio Paiva, acreditam que a saída de Samuel Elânio se deu em razão do aumento de homicídios no Estado e de uma declaração feita por ele, na semana passada, de que o crescimento do índice era "razoável".